Qing shao nian nuo zha/ Rebels on Neon God (1992 – TAW)
Alguns cineastas tem controle tão impressionante e preciso de suas capacidades e obsessões. A coerência da obra de Tsai Ming-Liang é algo assim… assombroso. Seus filmes bebem da mesma fonte, ao mesmo tempo, tão parecidos, e tão únicos. O primeiro plano deste, que marca sua estreia, focaliza uma cabine telefônica, lá fora uma chuva torrencial. A água, a posição da câmera, são mais que suas marcas, são formas de linguagem entre Tsai e seu público, uma linguagem cinematográfica espontânea sob um olhar passivo, sem deixar de ser contundente.
A presença constante e ameaçadora da água, a melancia, a câmera que se distancia e consegue focalizar dois ambientes (como se estivesse posicionada numa vértice), Lee Kang-sheng interpretando o silencioso Hsiao-Kang, são pontos que se repetem em seus filmes em pontos de intersecção que ganham significados ainda maiores pelo conjunto da obra.
Há a irreverência marginal na estreia de Tsai, os tais rebeldes do título são jovens fissurados por fliperamas. Dois deles vivem de pequenos golpes, de roubar máquinas. Hsiao-Kang é mais jovem e passa a perseguir um deles após um incidente entre este (de moto) e o táxi do seu pai. A explosão da juventude exposta de suas formas, dentro do núcleo familiar imposta pelo confronto com os pais. E nos irmãos que moram sozinho, num apartamento nojento cuja a água invade constantemente eclipsando essa sensação de caos.
Talvez seja o mais claro dos filmes de Tsai, isso não quer dizer didático, muito pelo contrário. Mas, as relações humanas estão clarividentes (irmãos, namorada, pais x filhos, o garoto que admira e repudia aquela mini-gangue), os conflitos juvenis tratados sem complexidade e nem um lado pueril, e sim de forma direta (vida marginal, falsos-malandros). A rebeldia de uma geração sob o brilho das luzes de neon.